CAPÍTULO 2
O Diário de Francisca
Um velho Diário, que vi minha mãe escrevendo em um caderno, meses depois da morte do Orgel, à noite sobre a mesa de jantar da sala, palavras de desabafo que ela registrava, para deixar na história da família, enquanto eu acompanhava cada frase sem entender muito o significado.
Este texto fala o seguinte: “No dia 31 de Julho de 1971, era sábado e tinha baile no Pavilhão de Festas da Igreja São Judas Tadeu na Vila Luiza, onde meu filho Orgel comprou uma arma, uma mausa de oito tiros, balas de aço, mas que adquiriu apenas com uma única bala, compra essa feita por intermédio de um velho amigo seu, soldado da Brigada Militar. No momento que foi feito o negócio, meu filho Orgel estava embriagado e eu como mãe afirmo que meu filho estava alcoolizado, porque fui eu que abri a porta quando ele chegou desse baile, as quatro horas da madrugada no domingo dia 1 de agosto. Ele deitou-se e dormiu até as onze horas da manhã, quando lhe acordei para que se levantasse, pois logo seria hora do almoço. Perguntou-me ele se o tal soldado havia passado por casa e eu respondi que sim e que se encontrava no Pavilhão da Igreja à sua espera. O Orgel saiu em seguida dizendo não querer café e que havia feito um negocião e que ia se encontrar com esse sujeito e logo voltaria para almoçar. Enquanto meu filho foi lá, eu arrumei a mesa e servi o seu pai e seus irmãos. Nisso o Orgel chega e largou a mausa em cima da mesa e naquele momento o pai dele não terminou de almoçar, dizendo; “Isso me cheira mal, não conheço essa arma mas sei que ela é proibida, ” mas o Orgel diz a seu pai que relaxe e se tranquilize, pois o soldado que lhe vendera essa arma, havia lhe dito que ele precisava de uma, pois sempre tinha muito dinheiro no bolso e que estuda à noite, mas seu pai revida: “Mas não essa arma. ”
Então responde o Orgel dizendo que o soldado vai conseguir as balas de aço no quartel para ele. Eu como mãe não me senti bem aquela hora e pedi que me entregasse a arma e então a guardei e por uma semana ficou bem escondida. O meu filho mais velho com 23 anos de idade, pegou essa arma por duas vezes seguidas para entregar à policia, mas não o fez pensando na briga que surgiria entre os dois irmãos e a mãe precisando intervir para que não acabassem por se ferirem. Antes tivesse sido assim.
No dia 07 de agosto de 1971, sábado, o Orgel não foi trabalhar devido ao feriado para os escriturários. Após o café ele saiu de casa as 10:30 da manhã, só voltando às 22:30 de táxi, numa noite fria, com soluços e cheirando a vinho, tirando um suéter que vestia e me pedindo um blusão branco que eu o ajudei a vestir. Pedi a ele que fôssemos até a cozinha e tomar alguma coisa, mas ele me respondeu dizendo que já havia jantado. Em seguida ele me pediu a arma dizendo-me que havia arrumado um bom negócio, vendendo aquele objeto por um preço maior do que aquele que ele havia pago. Nesse momento, entrou em casa seu irmão mais velho, alertando o Orgel para que tomasse cuidado, pois “…prometeram de te pegar.” Então o Orgel respondeu: “Deixa prá mim, isso é sem importância, o mais importante está aqui. ”- falou isso, erguendo a arma para cima. Depois me deu tchau e levando a arma, foi ao baile no CTG Osório Porto, na noite que cantava José Mendes, acompanhado por um colega de aula seu do terceiro ano de Contabilidade do Colégio Conceição e também colega de quarto de uma pensão que o Orgel ficava no centro da cidade. Chegando ao referido baile, chamaram o então soldado da Brigada Militar, para que os porteiros lhes deixassem entrar. Sim, entraram neste triste baile, aonde o Orgel, armado, dançou, bebeu e comeu até as cinco horas da manhã de 08 de agosto de 1971. Segundo o seu colega de aula, procurou-o e não o encontrou, entendendo então que o Orgel tinha ido pousar na casa dos pais, talvez no mesmo momento em que o Orgel havia descido ao porão daquele ambiente. Ali não sei o que foi que aconteceu, só as 17:30 da tarde de domingo que encontraram meu filho Orgel morto com um tiro ao lado direito da cabeça.
Então, neste instante, o meu outro filho, adolescente, que jogava bola na quadra de esportes da Igreja São Judas Tadeu, foi avisado por uns conhecidos seus que “…parece que é teu irmão que está morto lá no CTG Osório Porto…” assim, ele saiu correndo, sem antes vir em casa, pois não teve coragem de chegar e dizer: “Mãe, mataram o Orgel. ” E enquanto corria, pedia a Deus que não fosse o irmão dele, o mais querido dos irmãos, mas ao chegar no local aonde estava o corpo do Orgel, meu filho o reconheceu pela roupa e com ansiedade correu até ele, agarrou seu corpo e chamava por ele: “Orgel, ” largando o corpo em seguida, saindo correndo desesperado, mas os soldados da Brigada Militar que estavam no local, perceberam sua agonia e o seguraram, dizendo a ele para não fazer nenhuma bobagem e pense em tua mãe. Assim, a polícia levou o corpo para o necrotério, acompanhado por esse meu outro filho. Mas o mais triste ainda é que o Orgel ficou a noite inteira lá, sozinho o meu filho querido e só trouxeram no outro dia, segunda-feira, 09 de Agosto de 1971, às 10 horas da manhã para ser velado na Igreja São Judas Tadeu com missa de corpo presente, após um grande acompanhamento e sendo enterrado no cemitério São João de Bela Vista.”
Esse foi um registro escrito deixado por minha mãe. Mas segundo meu irmão mais velho, quem eram aqueles que queriam pegar o Orgel? Por que nunca ficamos sabendo o motivo e a que pessoas meu irmão se referia, àquela noite? Seria mentira, apenas para o assustar, ou haviam alguns vagabundos insatisfeitos e invejosos pelo carisma que o Orgel transmitia a todos, pois ele não tinha inimigos? Por isso acreditava-se, no início de toda essa trama, o que havia acontecido era na verdade, um homicídio.
"La Cumparsita" O tango preferido de minha mãe que jamais em sua vida saberia que um dia teria que sofrer uma grande perda. Saiba mais clicando em: www.ocasoorgel.com
Publicado por Everton Fischer em Segunda, 4 de dezembro de 2017
"Em cumprimento do Mandamento Celestial: "Parábola dos Talentos"
(Mateus 25. 14-30). CUMPRA-SE A PROFECIA.
Um acontecimento real, esquecido pelo tempo e que agora o passado que não pode ser enterrado para sempre...traz de volta.